Guitarrismos

Resumão do Jazz Theory, do Mark Levine

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Ainda estou em meros 22% dessa bíblia. Em linhas gerais, é isso que ele propõe

1 – Pra improvisar, de maneira grosseira, você precisa saber quais escalas funcionam em quais acordes (daí vem aquela teoria de escala de acordes que o povo daqui tanto odeia)

2 – Mais: tem que tratar as escalas como uma paleta de notas a serem usadas. O problema é que todo improvisador iniciante só manja de tocar escala de forma ascendente e descendente, de forma bem óbvia.

3 – O mesmo vale pra parte rítmica.

4 – Resumo: conhecer os modos da escala maior e menor melódica, escala alterada (dominante), tons inteiros (acordes aumentados) e dominante diminuta (para acordes idem).

5 – A qualidade do acorde vai determinar o que pode ser usado ou não. Se for maior, as opções são A, B ou C. Se for menor, X, Y ou Z. Aumentado, tons inteiros. Diminuta, escala homônima. A excessão é o acorde dominante que, apesar de ser acorde maior, entra numa outra categoria em função do trítono a ser resolvido. As tensões variam em função das notas melódicas ou dos graus do acorde – o acorde menor pode ser dórico aqui e eólio ali, etc.

6 – Existem infinitas possibilidades de escalas, mas na prática são bem poucas que são usadas

7 – Isso acontece porque cada acorde é tratado individualmente. Numa progressão ii-V-I, teremos tres escalas, uma pra cada acorde

8 – Parece muita coisa, mas esses padrões se repetem à exaustão. Chega uma hora que é inevitavel repetir os mesmos modos sobre os mesmos acordes. Daí o jazzista usa a escala alterada sobre o acorde dominante sem pensar muito.

9 – A pedra fundamental do improviso é usar escalas corretas pra cada acorde e se aproveitar de notas comuns.

Estaria o Hip Hop chegando na sua maturidade?

No curso de história do rock que eu fiz, tem um conceito importante que é o de estética hippie.

Basicamente, é a estética de se produzir uma música mais autoral, introspectiva e séria, beirando ao filosófico. Ao mesmo tempo em que fala dos grandes temas humanos, busca criar uma sonoridade equivalente, cheia de experimentos sonoros. Pra um estilo musical que começou cantando coisas do universo adolescente com três acordes, era uma mudança e tanto.

Aí eu vejo hoje gente como a Beyoncé e o Kendrick Lamar, fazendo hip hop e pop (não dá pra falar de um sem falar do outro hoje, embora não sejam a mesma coisa) com toda uma pegada igualmente introspectiva e reflexiva.

O último disco da Beyoncé é assumidamente sobre feminismo, relações abusivas, cura, renascimento e sobre ser uma mulher negra. Convenhamos, não são temas leves, nem divertidos e nem fáceis de digerir. Tudo com uma pegada pop bem forte.

Kendrick Lamar fez um caminho ao inverso, cheio de experimentos de sonoridade no seu ultimo album a ponto de ter gente dizendo que é um divisor de águas no hip hop. Se por um lado ele é mais inovador na sonoridade, ainda aborda os problemas clássicos do hip hop: violência, cultura negra, exploração, racismo

Pra estilos que até pouco tempo atrás eram em grande parte música de boate/academia e gansta rap, também tivemos uma mudança absurda.

Cadeias de pedais e o método de quatro cabos

Outro dia eu tava conversando com o meu irmão, que pro acaso trabalha com audio. Estávamos falando sobre pedaleiras e efeitos, e ele me perguntou se eu não sentia falta de alguma caixinha em específico, ou se eu não precisava de algum efeito maluco que ainda não existia.

Eu respondi que há milhões de efeitos no mercado que fazem coisas diversas e que eu não acho que consiga imaginar nada muito diferente do que já não tenha sido feito. Desde efeitos simples como um equalizador paramétrico ou um drive de dois botões até caixas que emulam o sinal de um diodo de germanio ligado numa pilha fraca, tem de tudo. Não há limites.

Convenhamos: a gente adora usar efeitos. Pode ser drive macio pra uma levada de blues, ou uma distorção pesada pra uma base de hard rock, ou leve “slapback echo” no pedal de delay e reverb só pra fazer uma graça. Normalmente a gente começa com uma ou duas caixinhas que amamos, mas não demora muito até o set de pedais começar a crescer e o número de botões pra girar ou apertar cresce exponencialmente. Isso também desperta a nossa curiosidade: começamos a experimentar diversos posicionamentos de efeitos na cadeia de pedais em busca do som perfeito.

Pode ser que encontremos o som perfeito para aquela música que estamos escrevendo ou para aquele arranjo que você vai gravar depois de amanhã. Mas pode ser que fiquemos horas mexendo em cabos e botões e tudo que conseguimos são sons bizarros ou que não nos agradem.

Arrumar um setup de pedais pode parecer rocket science, tentativa e erro pura e simples. Mas existe toda uma ciência por trás do posicionamento dos pedais.

Linhas gerais

Grosseiramente, existem três grandes tipos de efeitos: pedais de ganho (booster, distorção, drive e qualquer coisa que trabalhe amplificando o sinal do instrumento), filtros (que são qualquer pedal que funcione sobre faixas de frequencia – equalizadores, compressores, gates, etc) e efeitos de modulação (delays, reverbs, phasers, flangers, etc. – efeitos que funcionam a partir de um eco).

O que acontece é que a ordem dos efeitos altera o resultado sonoro final. Veja esse vídeo sobre os resultados sobre a mudança de posicionamento de um flanger.


Normalmente, o que se recomenda (leia-se: não é uma lei imutável escrita em pedra):

Ganho ===> Filtros ===> Modulações

O que se costuma fazer é colocar as distorções antes dos efeitos de modulação para evitar que o som fique “turvo” (ou “muddy”, como a galera anglófona gosta de chamar). Normalmente queremos um eco de som distorcido, e não uma reverberação sonora difusa pela distorção(a menos, obviamente, que esse seja o som que você procura. Quanto maior a cadeia de pedais e efeitos, maior o impacto do posicionamento dos pedais, principalmente se resolvemos ligar mais de uma modulação.

Filtro são um pouco mais flexíveis. Podem vir antes (compressores), no meio (equalizadores) ou bem no final (gates) após os efeitos de modulação.

Qual deles é o melhor? Depende. A priori, não existe maneira certa nem errada de se ligar pedais. O que existe é a maneira mais apropriada para o som que você quer construir. E saber posicionamento de pedais vai ter dar o controle necessário para garimpar o seu som.


Pré-amp

É aqui que a coisa complica um pouco.Como já foi dito em outros posts, o sinal da guitarra ligada num amplificador passa por três etapas:

  1. Etapa de pré-amplificação, na qual o sinal sofre um ganho. O objetivo é garantir que ele tenha uma boa relação sinal/ruído e, de quebra, colori-lo um pouco
  2. Etapa de equalização, na qual o sinal passa pelo circuito do amp onde se pode manipular a quantidade de agudos, graves, além de permitir o uso de algum efeito presente na caixa.
  3. Amplificação, na qual o sinal sofre novamente um ganho forte o bastante para mover os falantes das caixas.

Ora, o preamp é um circuito que opera dando ganho no sinal, que pode muito bem distorcer o som da sua guitarra (dependendo do pré, a idéia é essa mesmo). Assim sendo, talvez seja melhor ligar os efeitos de modulação (delay, reverb, etc.) depois do pre-amp, justamente para evitar que o som fique turvo.

Em cadeias simples, com um pedal de overdrive ligado em um delay numa caixa limpa, é bem provável que o som fique cristalino mesmo com essa disposição de pedais sem grandes problemas. Mas pra um set grande, com muitas caixinhas, as chances de se ligar tudo antes do pré sem bagunçar o som são bem baixas.

Loop de efeitos

Em caixas peguenas e cubinhos de estudo essa opção talvez não seja possível. Mas das caixas médias pra cima temos a opção de ligar os pedais nas entradas de loop de efeitos. Isso permite uma ligação entre o pré-amp (+ equalizadores) e o amplificador de potência.

Effects Loop
O nome dessas entradas costuma ser “Effects Send” e “Effects Return”, ou simplesmente “Send” e “Return”. Normalmente, vem escrito no amp a indicação de que é ali a entrada de loop de efeitos. O vídeo abaixo mostra como fazer quando se usa uma pedaleira, e o raciocínio é o mesmo quando se usa um bloco de pedais (você pode pular direto para 6:30 minutos para ver como são plugados os cabos)

Repare que não há obrigação alguma em se usar pedais de modulação após o pré. Nada impede que se faça o contrário, colocando a modulação na frente e as distorções depois. O método de quatro cabos é o que vai te dar essa flexibilidade de ligar coisas antes do amplificador de potência.

Qual o jeito certo?

Como sempre, a resposta vai variar em função da sua realidade, suas necessidades e daquilo que você deseja construir. Dependendo do som que você procura, a solução talvez seja justamente contrariar a regra e inverter a ordem dos pedais no sistema.

Tudo é uma questão de aprender como cada caixa funciona e qual o seu efeito na cadeia.

Tipos de captador

Meu texto anterior rendeu algumas perguntas sobre tipos de captador.

Dei uma olhada em algumas fontes bem bacanas sobre captadores de guitarra (aquiaqui e aqui, tudo em inglês) e cheguei à algumas conclusões interessantes.

– Ganho é algo relativo. Captadores single coil costumam gerar (mas nem sempre) algo em torno de 100 mV e humbuckers comuns algo em torno de 500 mV (mas nem sempre). Gosto de pensar que até uns 15o mV é baixo, e daí até uns 600 é medio. Daí pra cima é alto ganho – mas novamente, isso é um ponto em aberto.

Esses captadores de ganho baixo e médio são bastante versáteis e não distorcem tão facilmente. Por outro lado, geram sinais não tão intensos, que podem se perder em cadeias muito longas de pedais e racks de efeitos.

– Captadores ativos – isso é, com baterias embutidas – costumam gerar 1 V ou mais. São considerados captadores de altíssimo ganho e possuem voltagens impossíveis de serem geradas somente por captação passiva, sem bateria nem nada (que é o que 90% das guitarras tem).

A vantagem desses captadores é que eles naturalmente geram um sinal suficientemente forte em relação ao ruído natural da guitarra. A desvantagem é que eles tendem a distorcer mais facilmente. Ah, e as baterias, que tem que ser trocadas de tempos em tempos.

– Em termos práticos, não dá pra dizer qual deles é melhor. Cada um tem vantagens para uma aplicação e desvantagens para outra. O que dá pra fazer é escolher o tipo de captador que se gosta mais.

– Por outro lado, é muito útil saber qual o tipo de captador do seu instrumento, pois facilita na hora de calibrar (ou descalibrar) o set de equipamentos.

– A regra do tamanho do instrumento vale para captadores: quanto maior o tamanho e a voltagem, mais gordo e grave é o seu timbre. O mesmo se aplica ao número de bobinas: captadores simples tendem (mas nem sempre) a ser mais brilhantes e ter mais harmônicos agudos, enquanto que os de bobina dupla tendem (mas nem sempre) a ter um som mais encorpado, com ressonancia de médios e gravas.

Aliás, a quantidade de voltas do fio de cobre que envolve as bobinas também afeta o timbre do captador, e segue a mesma lógica: mais voltas e fios mais grossos tendem ao grave, e menos voltas com fios mais finos ao agudo.

– O timbre do captador também é dado pela sua construção e pela composição de suas partes: captadores de Alnico (liga de alumínio, níquel e cobalto) tem um determinado som, que é diferente de captadores de ceramica ou aço, por exemplo. Tudo isso interfere nas regiões de graves, médios e agudos e em quais delas o captador brilha mais ou menos.

– O ganho do captador interfere na resposta do instrumento ao toque. Captadores de baixo ganho são como microfones duros, enquanto que os de alto ganho (principalmente os ativos) são como microfones condensadores, super sensíveis ao toque.

Qual deles é melhor? Depende do tipo de som que você quer fazer.

Um ponto a ser considerado é que eles por si só não resolvem o timbre do instrumento. Tipo de madeira, construção (se o braço é colado ou encaixado), a forma como a parte elétrica é construída, o tipo de potenciômetro, o tipo de encordamento, se a guitarra é de seis ou sete cordas, se o captador está na ponte ou no braço, o tipo de afinação do instrumento, etc: tudo isso afeta o resultado final do som do instrumento.  Por exemplo, há quem prefira captadores brilhantes instalados numa guitarra de ash, que é naturalmente brilhante, com o objetivo de reforçar esses harmônicos. Ou então há quem resolva contrabalançar a madeira do instrumento, instalando um single coil em uma guitarra de mogno, por exemplo. Tudo é possível, e varia de acordo com o gosto do freguês.

Cada captador, independente do ganho, tem seu colorido próprio. Um modelo específico pode ter graves gordos e agudos estridentes e uma leve queda nos médios, enquanto outro que tem um colorido mais ou menos equilibrado em todo o espectro de freqüências.

Captadores de alto ganho nem sempre significam som distorcido: muitos jazzistas de som limpo curtem esse estilo de captação justamente porque eles de cara ela resolve o problema da relação de sinal/ruído da guitarra.

O mesmo se aplica a captadores de baixo ganho, que entram com um sinal limpo a ser distorcido por algum pedal ou pelas caixas. Jimi Hendrix, Slash, Yngwie Malmsteen, todos esses fazem sons pesados e incrivelmente distorcidos com captadores vintage de baixo ganho.

Qual deles é melhor? Impossível saber. Mas dá pra saber quais a gente gosta mais e menos. Ainda assim, o mais importante é conhecer o tipo de captação da guitarra e saber como tirar o máximo proveito dela.

Calibrando a intensidade do sinal da guitarra

Daí que eu tava atrás de uns tutoriais e dicas pra minha pedaleira, e topei com esse vídeo aqui:

Pra quem não sabe inglês (ou não sabe sobre pedais, ou sobre sinal da guitarra de maneira geral) é um vídeo sobre como criar um patch que permite medir a intensidade do sinal do instrumento que entra na pedaleira. Assim é possível regular a intensidade do sinal, atenuando caso ele esteja muito forte ou dando ganho caso o sinal da guitarra esteja fraco demais. Assim ela sempre opera no nível ótimo.

Já tinha estudado um pouco sobre intensidade do sinal nos meus dias de aula de home studio, mas não imaginava que dava pra fazer algo tão simples e prático pra ver na hora se o seu som está calibrado ou não.

O fato é que, ao testar o patch, descobri que o sinal da guitarra estava descalibrado: os captadores geravam um sinal um pouco mais forte do que eu imaginava. Isso fazia com que a guitarra tivesse o som ligeiramente distorcido quando eu colocava os botões de volume no máximo. Nada que criasse problema quando eu tocava em timbres limpos. Mas isso gerava um som meio embolado e sujo em distorções altas.

(Nada contra sons sujos e embolaos, aliás, se o seu objetivo for esse mesmo e você souber o que está fazendo. O problema é quando o sistema distorce o sinal sem a gente saber ou querer.)

Resumo: intensidade e caminho do sinal

Antes de explicar porque a calibragem é importante, é preciso explicar o que é o sinal do instrumento e como ele funciona.

Qualquer instrumento com microfone ou captador funciona convertendo o som gerado pelo instrumento num sinal elétrico análogo. Assim, um som intenso vai gerar um sinal intenso, e um som fraco vai gerar um sinal fraco. As freqüências e amplitudes do som e seus harmonicos vão gerar um sinal com freqüências, amplitudes e harmônicos parecidos.

Esse sinal então é injetado na cadeia de equipamentos de som que vão transformar de volta o sinal elétrico em um som amplificado. A forma mais simples de fazer isso é com uma guitarra ligada por cabo a um amplificador, mas a lógica é a mesma para qualquer sistema grande de show envolvendo mesas, caixas e microfones: o objetivo é pegar o sinal do instrumento e transformar em som amplificado em caixas enormes de palco.

Sinal x Ruído

Acontece que não existem componentes eletrônicos perfeitos. Todo equipamento elétrico e eletrônico gera uma determinadada quantidade de ruído mínimo ao funcionar. Ainda que os equipamentos sejam novos e altíssima qualidade, SEMPRE vai ter algum ruído.

Para que o som do instrumento seja ouvido sem problemas é preciso que o seu sinal entre no circuito com intensidade o suficiente para cobrir o ruído de fundo. Normalmente é o pre-amp do amplificador (que é aonde a gente espeta a guitarra em 90% dos casos) já resolve.

É esse ganho do preamp que permite que se eleve o som do instrumento sem elevar por tabela todo o ruído de fundo.

Distorção

Só tem um detalhe: circuitos eletrônicos são construídos para aguentar uma determinada intensidade de sinal elétrico. Se o sinal vier numa intensidade superior à qual o equipamento aguenta, ele automaticamente “corta” (“clip”) o excesso de sinal com um limitador embutido, evitando sobrecarga e danos.

Esse corte do sinal é o que se costuma chamar de “resposta não linear” de um sistema, que nada mais é do que um nome técnico para a distorção do sinal de áudio que está “quente” (intenso) demais pro circuito operar. E é isso que os pedais de distorção fazem de forma controlada.

Calibragem

Aí a gente retorna à primeira aula de microfonação: para conseguir um bom som, a primeira coisa que se faz é injetar no sistema o sinal de áudio mais intenso possível antes de chegar no nível da distorção. Normalmente, em gravações, isso é feito nas mesas de som (ou computadores, se tiverem uma interface de audio) ajustando a intensidade do pre-amp do canal do instrumento.

Sobre amplificadores, pedais e pre-amps.

O que pouca gente sabe é que o amp de guitarra também tem um pre-amp.

Na real, qualquer caixa de guitarra tem pelo menos três etapas: uma de pre-amplificação (pre-amp, que é responsável justamente por elevar o sinal da guitarra), uma de equalização (aquela com os controles paramétricos de grave, médio, agudo e/ou efeitos) e a etapa final de amplificação, que como diz o próprio nome, deixa esse sinal intenso o bastante para que ele possa mover o falante da caixa e assim emitir som.

Ou seja, a guitarra é como se fosse uma mini mesa de som.

O problema é: dependendo da construção da guitarra e da caixa, é possível que o sinal já entre distorcido no próprio preamp da guitarra. Captadores de alto ganho ligados num preamp de alto ganho fatalmente vão gerar um sinal distorcido logo de cara – é facílimo de perceber, basta abrir os controles de volume no máximo e ver como a caixa opera.

Pode ser que seja esse o som que você busca, principalmente se tudo que você tem é uma guitarra ligada numa caixa. Pode ser que isso nem te incomode.

Mas e se você não quiser essa distorção da caixa? E se tudo que você quiser é um timbre limpo e com as caixas falando alto mas sem distorção? E se a distorção que você quer for a de algum pedal e você dependa de um sinal limpo injetado no circuito? E se você quiser usar um pedal de boost pro solo sem cagar a base? Ou então um filtro de envelope, que reage à intensidade com a qual o instrumento é tocado e que depende de um bom controle do sinal?

Essas escolhas todas precisam que o som do instrumento não saia de controle. Você resolve isso calibrando o instrumento.

Entram os captadores e os pedais

Novamente, isso pode nem ser um problema pra você. Se tudo que você tem é uma caixa e uma guitarra, você vai ter um timbre limpo e a guitarra vai funcionar de boa mesmo com os botões de volume aberto.

Mas caso você queira usar mais de uma guitarra numa mesma caixa em um show (coisa bastante comum) é possível que ela responda de forma diferente, já que guitarras tem captadores diferentes com níveis de ganho diferentes. A caixa pode ficar muito bem timbrada pra um instrumento mas não pra outro, tudo porque os captadores geram uma diferença de alguns decibéis a mais ou a menos.

As coisas ficam ainda mais complexas se você botar na conta os sets de pedais: dependendo da quantidade de caixinhas e de como elas estão dispostas, você pode ter um sinal super quente (que já vai entrar distorcido no canal do amp) ou até perda de sinal. E eu nem entrei no mérito dos efeitos ligados no loops de efeitos das caixas.

Quanto mais elementos vamos botando na cadeia, maiores as chances de tudo sair de controle. E isso só se resolve calibrando o instrumento.

Tirando o máximo dos seus equipamentos

Em termos práticos, se você tiver uma pedaleira ou um monte de pedais de efeito você tem uma mini mesa de som com muitos plugins capazes de emular cadeias inteiras de pedais e preamps famosos. Se o sinal não estiver ajeitadinho logo de cara, as chances dele ficar todo cagado no meio da cadeia são grandes, e ninguém quer isso.

Nota mental

1 – Lembrar que dá pra improvisar sobre acordes dominantes (V7) como se fossem mini-progressões ii-V7. Assim, dá pra usar as notas de Dm7 sobre um acorde G7, por exemplo (sem esquecer do cuidado com a nota evitada, obviamente – no caso, a 7a de Dm7 que é 4a de G7, o dó). Em sequências de V7, funciona ainda melhor

2 – Lembrar que dá pra usar a terça menor quando for improvisar sobre um acorde dominante (que é obviamente maior). Num D7, dá pra usar o fá natural ao invés (ou junto) com o fá sustenido.

3 – O subV (vulgo substituto do V grau) se aplica a escalas e não somente a acordes: dá pra improvisar usando um Db7 sobre um acorde de G7, por exemplo (e vice versa)

Sobre ensinar o pobre sobre o que ele tem que ouvir

Saiu hoje uma coluna no UOL Notícias sobre o mito paternalista de que pobre precisa ser apresentado à musica boa, já que a que ele escuta é supostamente ruim.

Aqui eu levanto alguns pontos em relação ao artigo:

1 – A gente é elitista pra caralho: adora dizer o que o preto/pobre/favelado/[insira aqui seu grupo social desfavorecido favorito] enquanto ouvimos de boa o que eles produzem. A culpa varia, no máximo em função de quem tá por perto no momento.

2 – O brasileiro tem uma coisa de ostentação simbólica muito engraçada. Ouve feliz o funk e o sertanejo quando toca, mas fala que é uma merda quando precisa pagar de descolado, que o bom é ouvir o Jazz do Snarky Puppy ou o Dirty Loops (se for algo do momento) ou qualquer medalhão da MPB.

E às vezes a pessoa nem curte aquilo na real.

3 – A impressão que dá é que a gente ainda não entendeu direito o que é cultura pop.

4 – A galera fala como se passasse o dia lendo Dostoiévski e discutindo existencialismo. A vibe é inflacionar o capital intelectual

Se a gente fosse levar esse argumento muito a sério, não era pra ninguém ver, nem ouvir, nem ler nada que não fosse incrivelmente hermético, difícil ou denso.

Vocês iriam querer passar o resto da vida ouvindo Schoemberg? Ouvir a 5a de Mahler nos churrascos da vida? Pois é.

5 – A grande verdade absoluta e irrefutável sobre a cultura de maneira geral: é nos lugares pobres e fudidos que a vida acontece. O lótus só nasce no lodo.

O som de preto, de favelado, que quando toca ninguém fica parado (não precisa ser necessariamente funk: poderia ser o soul, o samba, o blues, etc.) vem desse mundo difícil. De gente vivendo no perrengue e que celebra a vida assim mesmo.

É por isso que todo mundo pira nesses ritmos. Mas ninguém quer admitmir.

6 – O grande problema da cultura de branco é que ela é uma espécie de cemitério para onde as outras culturas vão pra morrer: aquele som avassalador de dez, quinze, vinte anos atrás vira qualquer coisa clean e inofensiva, que dá pra ouvir no conforto do lar ou no carro, distraído no meio dos confortos da vida moderna.

7 – Existe critério pra definir se um som é bom, ruim, melhor ou pior que outro. Só que indicador social não é nenhum deles.

8 – Assino embaixo de tudo no texto, menos na parte que fala que o Ed Sheeran: ele é cafona sim – o que nao é nenhum problema. =)

Black Star

Esses dias tava perguntando na TL sobre qual o próximo disco pra “resenhar” – porque eu não resenho nada, só dou uns pitacos guitarrísticos mesmo.

Daí que ontem de manhã, logo depois de acordar e pegar o espertofone, li as notícias da morte do David Bowie. Ele, que tinha lançado um álbum novo dois fucking dias antes. Logo ele que muitos achavam que havia se aposentado de vez, havia renascido das cinzas.

Foi o último canto do cisne. Ou a melhora súbita que o doente tem antes de vir a falecer.

Ou renascido para a eternidade – e é assim que eu prefiro pensar.

Bom, respondida a pergunta pelo mundo, vamos ao disco:

1 – Ele é foda. Mas 90% do impacto e do sentido do disco só fazem sentido porque, bem, é um disco sobre a morte lançado pouco antes do autor morrer. Isso é ao mesmo tempo surreal, foda e paradoxal: a vida inteira acreditei que um disco devia funcionar por si mesmo, fechadinho. Aí vem o Bowie e lança algo que extrapola o limite do diálogo com o mundo lá fora e cria uma obra que é extensão da própria morte. Ou com a morte sendo extensão da obra.

Sabe quando um artista vai lá e apaga um desses limites que separam as coisas? Então…

E é lindo e desalentador. Ele tocou o projeto do disco ao longo dos seus dezoito meses de luta contra o câncer, sem ninguém de fora do seu círculo mais próximo saber. Foi tudo pensado.

Well played, Bowie.

2 – O disco tem uma pegada popzona anos 80. Se você se ligar, vai ver os samplers todos, a bateria eletrônica, a guitarra com aquele monte de reverb e chorus, etc, a pegada meio baladinha, etc. Quase dá pra dançar ao som da música, se pensarmos apenas no som puro, sem todo entorno.

Só que junto desses clichês todos, tem os sintetizadores com umas harmonias nada pop em meio a letras que falam do fim da vida e da futilidade da nossa existência no mundo. Os gotico tudo vão pirar nesse negócio.

3 – Guitarristicamente, não tem firulas difíceis, exceto pela harmonia que de vez em quando escapa dos cliches mais pop.

Mas, caceta, é uma aula de songwriting e uma aula sobre o que é a arte no final das contas. Sobre porque diabos a gente escreve músicas, estuda, ensaia e cria esse monte de ilusões e objetos estranhos e que carregam pérolas do mais puro suco da verdade.

4 – Tem muita gente que não consegue ouvir o disco porque ele fala de morte. É pesado, triste pra caralho e espinhoso, como é inevitável qualquer esboço de diálogo desse ultimate taboo.

É um assunto indigesto, mas que a gente precisa encarar de tempos em tempos. Todo mundo vai morrer – na real, a gente não faz outra coisa nessa vida que não seja morrer aos poucos, desde o dia em que nascemos.

O Bowie foi gênio nesse aspecto também: seria um convite a encarar e falar sobre a morte (e por tabela sobre a vida), se não fosse o fato de que ele nos deixa sem escolha (exatamente como a morte). É o assunto do dia, a pauta da semana, o tema do disco e o elefante na sala que a gente finge não ver. E ele vai ser eternamente lembrado por isso também.

5 – Ele é uma dessas figuras míticas que de vez em quando encarna por aqui. Deixou um legado imenso e reinventou o jeito de se fazer música. Entendeu como poucos o poder do pop e de como conversar com as massas.

Descanse em paz, Bowie. A poeira de estrelas volta ao cosmo. Um dia a gente se esbarra no infinito.

Dois cents do que aprendi em 2015

Daí que o Bulletproof Musician fez um post grandinho sobre as lições e investigações mais importantes de 2015, segundo ele mesmo.

Guitarristicamente, 2015 foi um ano bem legal pra mim. Consegui manter uma rotina bacana de estudos diários e de ensaios semanais. Toquei com muita gente e me apresentei em alguns lugares. Dei aula e tive aula por tabela, pois estudantes também são mestres implacáveis. Aprendi muita coisa da minha profissão, dessas coisas que se aprendem na rua ao invés da sala de aula. Musicalmente, amadureci bastante.

Então, quero deixar aqui meus dois cents de sabedoria:

1 – Estudo metódico e regular funciona: talvez seja o mais difícil de alguém perceber, principalmente quando se está começando. A gente vê a estrada, as páginas dos métodos a serem lidas e a quantidade de aulas e ensaios a serem feitos e nos intimidamos.

Só que, sendo diligente, as coisas acontecem e a gente melhora. É difícil perceber isso enquanto praticamos, justamente porque estamos tão imersos naquilo que não dá pra olhar com calma com um olhar de fora. Nosso foco inevitavelmente cai no que é mais micro, expediente e pontual. Mas quando completamos um ciclo – um fechamento de um ano de trabalho ou ano letivo, férias, etc. – a gente consegue se desengajar da prática e perceber de forma mais objetiva o que mudou em nós.

É como perder peso: é difícil notar algo visível se olharmos pros nossos corpos diariamente no espelho. Mas se compararmos fotos de antes e depois, veremos a transformação (assumindo-se, claro, a mudança no estilo de vida)

2 – Estudar é tão importante quanto não estudar: desengajamento da prática é importante. De tempos precisamos abandonar por completo nossas rotinas e fazer algo lúdico para recarregar as baterias: viajar, passear por aí, ler alguma coisa, jogar videogame, etc.

Pra mim, é algo que fica bastante nítido nesses dias de pausa de natal e ano novo.

Fim do dia, finais de semana e férias tão aí pra isso. Mas é muito fácil a gente esquecer a hora da pausa e querer compensar por algo que não ficou muito bom no ensaio, ou que parece permanentemente capenga. Parece uma boa idéia redobrar os reforços (de vez em quando é inevitável), mas isso tem um preço.

A mente e o corpo precisam de tempo para se recuperar. O descanso é parte do caminho e da rotina de estudos.

E vocês? O que 2015 trouxe de bom (ou levou de ruim)? O que vocês aprenderam? E o que vocês querem nesse ano de 2016?

Da minha parte, desejo um ano épico para vocês. Que vocês cresçam bastante, aprendam, conquistem coisas e se divirtam no processo. E saúde – que na real é o mais importante. =)

Aula de hoje: “Pagode Jazz Sardinha’s Club”

Daí que o disco dessa semana é de música brasileira. Alternando com o da semana passada, que foi de hip hop (bem, não exatamente), nessa semana temos um discão de samba – mas, bem, não exatamente.

Assim: o disco é de uma gig de samba de responsa. Nunca tinha ouvido falar e nem sou especialista em samba (na real, ouço muito pouco, menos do que deveria), mas ouvi tudo e ta tudo lindo e arrumadinho, sem sobras nem nada faltando.

Pagode Jazz Sardinha's Club

Mas, na real, o disco flerta com um monte de outros rítmos – o que também é uma marca registrada do arranjo brasileiro. Um pouco de raggae aqui, uma batida techno ali, uma baladinha acolá, e por aí vai.

Só que os clichês de samba também estão todos lá, dos solos de trombone e sax aos “laiá laiá” que todo samba tem. Mas o negócio foi feito com um controle tão bem feito que o clichê vira um ornamento, ao invés de um problema (e clichê = problema em 99% dos casos). Tipo quando o arranjo vocal soa um pouco diferente do que você escutaria num disco de samba mais classicão. Ou a construção de uma das composições, que também não tem cara de sambão tradicional.

Pois é. É mais um desses discos que dá uma certa coceira de ouvir, justamente pela ambiguidade. Tem horas que parece jazz, tem horas que parece samba, tem horas que não parece nem uma coisa nem outra. E tirando meia dúzia de momentos muito WTF, o disco é cool do começo ao fim – coisa que não é exatamente comum nos discos de música brasileira.

Talvez tenha sido uma das melhores aulas de como administrar e tirar proveito de clichês – afinal de contas, por que gastar tempo e energia inventando moda se já tá tudo aí pra gente usar, não é mesmo?